"Foi uma eleição indireta porque venceu quem tem mais pra oferecer pra classe política, a lei não teve nada a ver com o resultado."
É dizer que os políticos, isolados da sociedade, votaram em favor próprio, ignorando quem os elegeu, ignorando a lei, co-optando o supremo e o TCU (versões incluem o Sérgio Moro, a Rede Globo, a Band, a Record, a Força Sindical, o FBI, as empresas petrolíferas norte-americanas, a FIESP, etc e tal; já vi versões incluindo o PSOL dado que eles só confirmaram ser contrários ao impeachment um dia antes da votação), para realizar uma eleição indireta.
Tu tá sendo simplista e eu me sinto ofendido com a sugestão de que eu defendo essas teorias idiotas.
Primeiro, o supremo não precisa ser coptado porque ele não diz nada sobre o mérito do impeachment, somente sobre o processo. O processo de fato tá sendo seguido, mas o golpe tá no mérito.
Segundo, muitos políticos votaram sim em favor próprio, porém só se sentiram livres pra ir tão longe por causa da rejeição da Dilma. De qualquer modo, clamor popular não implica respeito às leis.
Terceiro, o TCU não é exatamente isento e os ministros do órgão são indicados políticos. Não esqueça que TCU não pode condenar presidente, ele só recomenda a condenação porque é orgão assessor do congresso. Além disso, o TCU não define se decretos suplementares e pedaladas são crimes de responsabilidade. Não é qualquer crime que é crime de responsabilidade.
Pelo que tu escreveu, fico com a impressão que tu não conhece muita gente que defende que o que aconteceu é um golpe, ou se conhece, não é uma amostra representativa. Há vários juristas de respeito que consideram que não há crime de responsabilidade e que o que está acontecendo é um "soft coup", e há muita gente que denuncia o golpe e não acredita nessas coisas absurdas que tu citou.
Pra deixar bem claro: eu tenho certeza que o Moro e o Janot e sua equipe são parciais, afinal não tratam todos os partidos do mesmo jeito. Agora eu não tenho a mínima idéia do que tá por trás da parcialidade deles. A parcialidade pode ser tanto explicada por eles serem tucanos, ou por eles atuarem sabendo que é muito mais fácil condenar alguém do PT porque PSDB e PMDB tem vários "amigos" no judiciário, entre outras inúmeras hipóteses.
Notícia que acabei de ler sobre busca de apoio do MPF as dez medidas contra corrupção:
"A Folha apurou que as procuradorias em cada Estado estão mapeando entidades de interesse em seus territórios e convidando-as para reuniões com membros do Ministério Público Federal dentro dos prédios do órgão. Não há relatos de grupos de esquerda entre os convidados."
http://www1.folha.uol.com.br/poder/...dem-a-grupos-anti-dilma-apoio-a-medidas.shtml
Que eu saiba, a esquerda é contra corrupção. Isso não sugere parcialidade do MPF?
Da mesma forma, quando você fala "golpe", isso é um discurso particularmente partidário de uma elite política que quer varrer pra debaixo do tapete os próprios erros e dizer que tudo que aconteceu de errado nasce e morre com o Temer.
Novamente tu tá sendo simplista. Isso que tu mencionou acontece, mas não é meu caso nem de muito gente que eu conheço. Quem me conhece sabe que venho apontando erros no governo Dilma desde 2010 e que critico a esquerda em vários pontos.
Enfim, há marketing e jogos políticos e forças agindo em interesses próprios, mas nada disso é uma ruptura com a normalidade.
Derrubar presidente sem crime de responsabilidade é ruptura com a normalidade.
O Brasil não é um estado de exceção. Teremos eleições em pouco tempo e elas ocorrerão normalmente (espero);
Soft coup ou golpe parlamentar não necessariamente implica na existência de estado de exceção e é algo diferente de golpe militar. O golpe de 2016 não é nada perto do que foi o golpe de 64. Mas não deixa de ser golpe.
O golpe de 2016 se assemelha ao golpe de 2012 no Paraguai, onde aprovaram um impeachment sem bom motivo e derrubaram o presidente em favor de um vice conservador com bom trânsito entre a classe política. O Paraguai não virou ditadura, não houveram tanques na rua e novas eleições ocorreram normalmente. Nem por isso o que aconteceu deixou de ser um golpe.
os nossos votos valem exatamente a mesma coisa que sempre valeram (ou seja, quase nada individualmente);
Os votos de quem elegeu a Dilma deixaram de valer com o impeachment.
Democracia é isso mesmo. É o político defendendo que tem que haver teto no gasto primário para não cobrar da Globo o que ela deve e todo mundo aplaudindo.
Democracia também implica respeito às leis e ao voto.
A gente elegeu uma presidenta de esquerda, mas também elegeu o congresso e o senado desequilibradamente conservador. É teoria da conspiração ignorar todo o contexto desse cenário político bagunçado e complexo em prol de uma mera união entre elites que derruba presidentes que o povo apóia.
Tudo que tu escreveu nesse post questiona a narrativa petista de golpe, não a minha visão. Eu não disse, muito menos acredito, que a Dilma tem apoio do povo. A falta de apoio é exatamente o que permitiu a derrubada dela. O que houve: uma presidente sem apoio da classe política e da elite economica foi derrubada, via golpe parlamentar, uma vez que perdeu o apoio da maioria dos seus eleitores. Tu pode achar maravilhosa a possibilidade de um recall para retirar um presidente impopular antes do término do mandato, porém a nossa consituição não permite isso.
E só pra ficar bem claro que eu não sou seletivo: considero Maduro um golpista, já que ele usa do seu controle sobre o Supremo pra reverter decisões desfavoráveis tomadas pelo congresso e manobra pra evitar um referendo previsto em lei que pode revogar seu
mandato.
Existe, sim, tais jogos de poderes, mas eles sempre existiram, eles não foram inventados em 2015 com o propósito de derrubar a Dilma. Se nós não temos democracia agora, então nós nunca tivemos.
Jogo de poder é diferente de derrubar presidente eleito sem motivo.